Antes
de tudo, saibam que não sou mais religioso (leiam “Peço, logo, Creio”). Deus
deixou de ser base de muita gente, e o que acontece hoje é uma espécie de
guerra ideológica entre aqueles que ainda creem e os que deixaram de acreditar.
Estes últimos fundam suas críticas contra os crentes em cima daquilo que julgam
irracional, ou seja, nas práticas religiosas que, segundo eles, são
inconcebíveis para o senso humano. Exemplo disso é a tese que reduz Deus a uma
suposição: o ser que dá sentido às principais religiões mundiais é simplesmente
uma hipótese sem prova concreta de existência. Durante 2.000 anos o Ocidente se
desenvolveu em cima daquilo que alguns acharam uma boa ideia, adotando-a sem
experimentá-la, sem que pressupostos científicos comprovassem sua eficiência. Segundo
a tese, Deus não passa de um tiro no escuro que atingiu o alvo, provocando o
derramamento de sangue que literalmente deu novas cores à humanidade.
A
ideia analisada vai mais longe: a hipótese de Deus deixou de inspirar até mesmo
os que creem nela. As medidas adotadas pelos dirigentes religiosos fogem dos
argumentos que no início fundamentaram a suposição em que acreditam. Os
religiosos creem na hipótese de Deus, mas praticam uma fé que escapa dos
preceitos que inicialmente sustentaram essa hipótese. Trata-se de um
desencantamento com aquilo que não pode ser cientificamente comprovado? A
religião está deixando de limitar-se apenas ao culto constante de uma figura
que não pode ser vista?
A
resposta para as duas perguntas é não. Os fiéis professam sua fé e guiam suas
vidas em cima daquilo em que acreditam e não do que acham que é. Para um
religioso, Deus realmente existe. É ideal, (o ideal platônico), ou seja, o
significado último que não pode ser visto, mas deve ser constantemente buscado.
Não se trata de uma suposição que necessita de provas concretas, como registros
e amostras: Ele é e pronto. Se não vale para um ateu, que este busque outro
sentido para a sua existência.
A
religião não está deixando de limitar-se aos seus preceitos fundamentais porque
na verdade nunca foi assim. A Igreja e o poder que faz parte dela são o resultado
constante de um movimento que atravessa a sua própria história. O cristianismo
reformulou certos valores judaicos, e estes também o fizeram a partir das
ideias do antigo Zoroastro. Como qualquer discurso, a religião adequa-se ao seu
contexto e vai sendo reformulada dia após dia.
Os
argumentos que prejudicam a convivência em sociedade, como as ideias
discriminatórias de boa parte dos religiosos, devem sim ser combatidos, mas a
discriminação daqueles que não creem não pode ser ignorada. Cada um tem
liberdade para pensar, crer e agir da maneira que quiser, desde que a
existência do outro não seja negativamente afetada. Entre os sentidos que regem
o mundo, sejam eles racionais ou não, o que deve prevalecer é o do respeito
mútuo, pois as diferenças sempre existiram, e as divergências entre elas podem
ser resolvidas por meios melhores que os taxativos e condenatórios.
Fernando Costa e Silva
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