sábado, 15 de fevereiro de 2014

Pilantra Safado

Meu coração é cínico
não atende, não entende,
não se espanta
com a frieza latino-tântrica
frente à guerras e traições
à tremores de terra e de prerrogativas
orgasmos ou organismos aprazíveis:
meu coração é incabível.
Monstruoso e viés,
esse é meu coração.
Vaga por ermas avenidas
sentimentos em vales desérticos
sorrisos ávidos plásticos
anos de frutificação inalcançável.
É um fruto que só se colhe
em tempo de má-colheita.
Arremessado à locais de derrota
carregado por homens e mulheres da maior introspecção.
Mas ainda bate, deliciosamente: bate.
Continuada e rispidamente, bate.
apesar do intenso calor.

Utilizo-o como qualquer um
inutiliza qualquer coisa.
É piada de mau gosto contada em velório.
Desesperado, desinteressado,
energúmeno e necessário,
o meu coração.

Nele fixo dizeres:
“cuidado, cuidado, cuidado”
que leio sem comedimento.
É fatal, é mais que fatal, é holocausto interno.
Orem e operem meu coração
chorem e cuspam meu coração
peçam e gozem meu coração.

Não quero ver
a face dos que são de coração
que vivem de coração, que pedem de coração.
Estou farto, parvo, gabo o arredio.
Menor que o mundo, mas todo audível.
Meu coração me deprime,
é um louco, um pilantra safado.
Meu coração é um exército.

Meu coração é que é o poeta.

João Gonçalves